à saciedade






anny maddock






.
.

aproveita a fresta da janela para se introduzir num espaço desconhecido .voa em círculos primeiro pequenos depois mais largos a fim de identificar o espaço e os objectos .colide com uma superfície plana .volta a bater as asas e apercebe-se que no seu corpo os estragos são de-menos .sacode a cabeça uma duas três vezes .ganha fôlego e atreve-se a um voo mais amplo .começa por sobrevoar um primeiro objecto não identificado e outro onde algo se mexe .inspira .reconhece o cheiro a sangue .suspende o voo .expira .volta a inspirar de modo a concentrar todo o oxigénio que necessita e reconhecido o terreno lança-se em voo picado .em transe o ventre incha e saciado
o mosquito apaga-se sob uma palmada aplicada a preceito







entre gritos






anny maddock






.
.

há dias em que o poeta se cumpre .estabelece compromissos com os signos tendo-se como senhor absoluto .estipula pactos que nada têm a ver com sangue .antes um abrasar de conflitos onde a fala converge à sua humilde projecção

outros há em que o poeta se isola .quer-se a brigar com as heregias que vagueiam num redopio des.conexo como se o golpe final da escrita fosse um acto de contricção .assume-se como um equívoco .sabe-se em equívoco
in.diferente ao grito de um acordo prestes a ser violado





in memoriam






anny maddock






.
.

-aos meus irmãos






despida de quaisquer adornos deslizo pelo espúrio
.perco-me entre os substantivos adjectivos e verbos sem me acomodar
.imagino-me suspensa numa linha
submersa numa hipérbole e

gravito
como filha esquálida da latinidade para

memorar
em cada badalada do relógio da Sé a
relatividade da vida sabendo que a morte é um velho baú onde
somos forçados a restringir as nossas aspirações

inabituais no jogo de xadrez
os meus irmãos arriscaram em seis meses o último lance
 xeque-mate





as veredas da escrita






anny maddock






.
.

que pertinácia a de José

insiste em chamar a si os louros de cantos in.usitados .com a sua mochila às costas vai percorrendo as veredas da escrita sem olhar aos meios que justificam os fins .nem ele mesmo ousa  esconder o pacto que celebrou com Belzebu .este granjear-lhe-á a fama que anseia .ele compromete-se a colocar máscaras sobre máscaras numa pantomina endiabrada .de quando em vez ao en.veredar por um atalho escorrega  esfola um joelho levanta-se e com o seu próprio cuspo limpa as feridas que lhe maceram o corpo .um sorriso esculpe-lhe a face e é com ele que tenta envolver os de.mais na sua teia ou conduzi-los a teia alheia

pobre José simples farsante

entregue aos jogos vai perdendo a noção do real .o seu mundo especulativo enreda-o e ele não se apercebe que todos e cada um apesar do mito ariano são múltiplos dispersos mestiços e plurais

acorda José

"as coisas importantes são invisíveis para os olhos"





indigestão






anny maddock






.
.

as letras inserem-se no peito .os números fazem-no nas costas numa ordenação de 0 a 20 .umas e outros costumam encontrar-se e deambular pelas artérias e veias .vagueiam ao ritmo das batidas cardíacas e há quem afirme já os ter visto à porta do estômago .houve quem os reconhecesse em fase mais terminal e lhes tenha indicado um percurso alternativo .eles agradeceram e partiram em de.banda .sabiam-se emparedados e por isso teimavam em oscilar ora na vertical ora na horizontal numa tentativa de alargar a vereda que os induziria afogados e flutuantes à evidência do intestino
agrada-me saber que apesar dos divertículos tudo lhes correu de feição





deambulações em dó menor







anny maddock






.
.

insere-se num novo movimento invasor da intim.idade alheia .a sordidez e o fascínio inscrevem-se no ritmo das teclas .há momentos que impedem o impulso como se a luz trémula de uma vela se acoite num peito aberto à demência
demente é que ela não é
apesar das pausas in.desejadas do seu pensar .é um excedente suspenso no enigma existencial que a absorve .induzida em privilégio fabula tentando conferir sentido à vida que vai engendrando em cada epístola .agarra-se a esse estatuto como matéria prima literária
de onde não ousa quitar-se





os mutantes






anny maddock






.
.


sentada sobre a pedra olha as mãos .dobra os dedos e articula-os em gestos des.conexos enquanto o pensamento vagueia .um dia talvez ele aporte a lugar seguro mas por ora quer-se des.ordenado como os objectos em redopio .sabe-se uma aprendiz de Homero entregue à cegueira que se res.guarda na criação a fim de modelar uma outra realidade .as palavras são a sua matéria-prima .traça-as a belo prazer entre a fúria de uma sinfonia in.acabada e a tela onde risca certos modelos como mutantes da realidade .entrega-se de corpo e alma ( palavra esquisita esta ) ao frenesim dos textos para deixar inscrita no porvir a sua memória em cartas que se jogam ao acaso .um dia alguém ousará etiquetá-la na estante dos ignorados alfarrábios





olhar de a-mar






anny maddock






.
.

mergulha na água em busca do re.tempero que o espreita na cachoeira .jovem havia conhecido a servência .da água que desce e se multiplica nas gotas que constituem o lago

é na margem que ela mergulha .sente a água percorrer-lhe o corpo abraçá-lo .acha-se única naquele contacto .arrepia-se e lembra o primeiro orgasmo
ele desce a ravina e mergulha na água .escrevera no tronco o nome deles e no momento antes do salto decorre a cerimónia protocolar da leitura .entra nela

a água acolhe-o ao bater na fraga .a mesma água que a en.costa deixa aberta ao caminho .não sabe que futuro existe para aquele banho de lagoa em cachoeira de água doce .levado pelo barulho o mundo deixa de existir em derredor .só ele e a água .o absurdo da existência partilhada a dois

ela mergulha de novo e basta-lhe sentir a cara molhada para esconder um sorriso .é um segredo muito seu .não .partilhado com a água .sempre a água

presente desde menino no útero materno .sabe-se infante ao encontro do Ser-perfeito .entra e sai .mergulha e sobe à tona para voltar a mergulhar .o absurdo da existência no contacto com a água .Amante

ela o receptáculo .ele o falo

ou o jogo em que a água é o pronome pessoal .um verbo a conjugar .in principio erat verbo .há um brilho muito especial no olhar de a-mar





à laia de explicação






anny maddock






.
.

meu amigo
este livro será um caderno de notas que lhe enviarei e onde - de epístola em epístola - me entregarei a diversos devaneios
.usarei um caminho de palavras onde sem reservas co.habitarão demónios e anjos



ps – pressagio uma resposta trivial se e quando lhe aproezar





libretto


























andamento
epistolando o in.certo







epígrafe






Os grandes sistemas do pensar, da ciência;
as grandes correntes literárias e artísticas,
os grandes ideários políticos ou religiosos.
Tudo passou.
Restos detritos fragmentos.
Toma o teu bocado e
senta-te no vão de uma porta a comê-lo.

_Vergílio Ferreira

ousamos um mar de sargaços
antes de dançarmos descalços sobre os continentes

_Gabriela Rocha Martins




















.1






daniela ovtcharov





















dissonâncias
a que alguém ousou chamar poemas










memórias de um passado presente






.
.
.

solfejam-se restos de marés quais quadrigas
que se comprometem na rebentação 

perpendiculares ao Caos os corpos oscilam e
os olhos têm-se limos que
nos braços deixam maresias por resolver

relembram vagas


tumultos soltos a que a diáspora nobilita 

num velho-novo olhar

cantos que a noite não apaga
num acordar marinheiro






anny maddock





a in.clemência dos pacientes .ou a arte de pleitear contendas




.
.
.


páginas in.sanas 

desmedram-se envoltas em tule 
na inclemências dos deuses 
.tecem lonjuras e 
de porta em porta 
disfarçam-se os demónios 
envoltos em serpentes 
.as árvores do quintal 
resgatam dos melros o chilreio 
.tudo se vai esquecendo e 
na cidade ontem berço 
cada um refaz em língua brava 
o que é lugar de tardança 
.os meninos 
esventradas as sombras 
erguem paliçadas 
soltam risos 
abrem os joelhos a avisadas cicatrizes 
receiam dos cães a gula e 
o afecto e 
os velhos tomam como certa 
a velhez da urbe 
.sento-me à espera 
do declínio da mansão 
da palavra anterior ao grito 
e pinto novelíssimas matizes 
no tempo 
.deito fora esboços e 
projectos e 
na diosa mansão de azulejos 
grávidos de sol 
talho dos abutres 
os seus heterónimos 
.inicio breviários 
dos deuses e dos demónios
como bargante-felina






anny maddock





no cansaço da demência .o regresso a casa






.
.
.


mergulhada num turbilhão de equívocos 

regresso a casa 
.à minha casa sobranceira à falésia dos argonautas 
.trago comigo o absurdo dos genocídios e 
a cadência de quem se arroga senhora de dormências 
.passaram muitos anos sobre o meu regresso 
.o velho caramanchão e as gargalhadas das crianças 
enchem de mentiras o espírito do lugar 
outrora espaço de vivências 
.alguém desafinou o compasso do tempo
 de.sinformando os acordes das estrelas 
ao sabor de des.inteligências 
.os restos não se apagam como mutantes 
.antes se adoçam nos alasbastros e 
nos cortinados de veludo verde 
.sobram os espelhos e 
os pianos imploram saudades 
das mãos que sobre os teclados 
reclamam outras sonatinas 
.tudo é velho e longe e
eu passiva 
refaço no vento um outro lugar de complacência 
antes de transportar no último cálice 
a virulência dos demónios
no freio equídeo dos deuses 






anny maddock





de golpagem em golpagem .o mito




.
.
.


sou na irrecuperabilidade do agora 

a desmedrança que me traz cativa 
.sei-me agnóstica 
.apraz-me a lonjura de Poseidon e 
a supressão do pecado 
.da matriz faço pousio 
em voto de anonimato 
.no livro das horas lanço 
o último assento 
.sou paciente 
.a engrenagem que conduz 
ao caos torna-me resistente 
como juiz de causa própria 
.e sou tão paciente 
que des.arrumo nos jornais 
o vómito 
consciente que o regresso à casa-mãe 
é de Medusa o prometeu 
.as serpentes ondeiam em lugar sagrado 
.emigrante na planície de Cistene 
deito a miragem na pedra 
.a cabeça 
.o golpe 
.a rendição apócrifa
.cada vez sou mais paciente






anny maddock





o insapiente des.arrumo do volúvel




.
.
.


castigo o fastio 

.pergunto pelo momento 
.pelo segredo em que ler 
é o logro do legente 
.escrever a adjacência do escritor e 
Ser o acinte da ausência 
.ser em ausência-a-presença 
onde assino em branco 
onde colo os elementos exigidos 
por Sophia e 
se a asfixia for o modo 
de ascender ao grau superior 
darei a face 
depois de acender a vela 
do laico culto 
.é no absurdo do Ser-em 
que me arrogo 
confidenciados os modos 
.um passo 
à distância jazente do sentido 
.invisto e planejo o golpe 
conspirando a rendição 
da espécie humana  
.iludo a matilha 
.recupero o gesto e a gesta no vazio 
das decisões inseridas em livro 
para renascer 
no des.encontro entre matéria e 
anti-matéria
des.arrumado o assertivo





anny maddock





e depois talvez seja o tempo da rosa






.
.
.


e depois que dizer do tempo 

que teimosa
mente

se alapa ao lápis? 

transgressão férvida 
.sei-o chorando sobre as pétalas
não depuradas 
pelo branco que rasura a lonjura 
.sei-o quando a tarde declina 
.não me perguntes por ti 
.não te apaguei
.talvez te tenha escondido na algibeira 
da onda que no meu peito se adança 
.faúlha ou acendalha que abrasa 
o absinto ou
a necessidade de te perguntar 
pela flor que colheste manhã-cedo 
na passagem para o quarto 
.o tempo esconde-se no meu ventre e
tu vens 
senhor de todos os símbolos 
tentar a colheita das rosas 
.quedo-me muda e
tu demoras na tentação de abandono 
a que não és






monika serkowska





ad astra per aspera*






.
.
.


insisto em que a crista da onda 

se desfaça em escuma 

para em terra ser 

o que a água enjeita 
.“ad astra per aspera” 
.e assim voraz apronto 
uma nova livrança 
.intermitentes os meus pés 
confundem-se ao agilizar 
a plenitude de um cântico 
erigido a Poseidon 
.acendo regressos 
.confundo partidas 
.estou mais dentro 
dum mapear de sombras 
onde a luz é um murro 
dado no estômago 
.assinalo a falta 
ao ocultar a cegueira 
.ao entender o movimento 
que se insere num atordoar 
de coincidências pouco coincidentes 
.recolho à lavoura para reverter a brisa

.nem tudo se resume a um risco de lápis




____________________________


*até às estrelas através da adversidade







monika serkowska





mais a-dentro é que te faço morada




.
.
.


aquietados os rasgos de genialidade 

resistimos 
e somos o cais dos barcos
.mais nós 
.talvez dos outros camadas e 
camadas de falsas tendências
.despir o silêncio e ser na voz 
o grito átono de quem acende 
o coração 
.na ascese a seiva 
.do arquétipo o enigma 
ou o ponto comum rente ao abismo 
.somos e sou discreta ao fechar a porta 
quando abro a janela e escrevo 
.agora que os dedos falam 
.agora que as letras se soltam 
imprimo a minha face 
neste estio morrente 
e sirvo 
um corte 
uma pausa 
um golpe 
um acaso 
uma cor 
uma boca 
o agora tão só o presente 
onde a revolta se inscreve 
.bastam-me as bestas
para escarnecer a face 






monika serkowska





abrem-se as notas a novas serenidades




.
.
.


porque se me asseguram 

rasos os pontos de confluência? 

porque resistem as mordaças 
ao sufoco das vozes? 
porque nós e não os outros 
na in.quietude mordaz que tudo devora? 
contrários os ventos na convulsão 
das memórias 
.proscritas no branco em que te dispo 
.como simples eco 
de vozes concertadas 
.de Bach a primeira sonatina 
.de Mahler o fogo que os dedos 
afloram em doces sinfonias 
.e Ofélia? 
abrem-se as notas a uma nova serenidade 
talvez mais pessoana 
.talvez mais minha 
.agigantados os medos e 
escondida em letras de fogo 
a originalidade feminina 
somos escravos de um saber mais outro 
.senhores de um ser mais luz 
.e depois na constatação do menos 
somos o mais 
na lenha do braseiro 






monika serkowska 





se o tempo for de bonança






.
.
.




amanhã quando acordar as palavras 

desenharei num a-braço um pouco mais de nós
e no registo de um tempo-novo 

exceptarei sem omissões
uma gargalhada 

ao som de um stradivarius







anny maddock





desfaço na in.certeza a baínha do texto




.
.
.


vestida de névoa e titulada de silêncios 

vou de barca em barca em demanda do ventre 
.digo adeus à lógica 
.rendo-me ao equívoco
.construo muralhas 
.desconstruo paliçadas 
de mãos dadas com o perigo 
.sei de um pensar diferente cada vez mais traço 
cada vez mais linha 
.do texto quebrado na presença do essencial 
agraço-me em terrenos baldios 
.a poeira sendo raiz de outras demandas 
grassa em textos reservados em baús 
repletos de teias a que os deuses apelam de devassa 
.talvez sonetos 
.talvez redondilhas maiores ou menores conforme o pano 
.indiferente às recensões cravo os dentes 
em felinas maçãs numa fria insurrecção 
.a tanto rara 
.a tanto crua 
.navegante de um mar de fora 
atenho-me ao festim que me espera no porto 
.descarrego palavras e mortalhas
.não tenho pressa de aportar

.sou raiz de um escrever rente 

.um lapso que se quer vário







anny maddock





sei de rumos .não sei de cardos






.
.
.


inóquo o beijo da serpente que de manso se enrola na indiferença 
baixada pelo último dos mortais 
.é genesíaco o seu balouçar de cabeça 
.aprumada a mim que a espreito da janela do escritório 
.olha-me como um parêntese aberto à crispação da minha pele 
e eu retribuo-lhe o olhar a tempo de esventrar anseios 
.somos dois seres em suspensão 
a cerzir o silêncio de uma tarde vestida de novas vibrações 
.uma apronta-se às vésperas 
.a outra à concepção 
.ambas roemos o im.possível e 
confirmamo-nos na despedida de um Verão que se concebeu em excessos 
.dista-nos a idade a derreter bocejos 
.de nós o ensejo apostado num futuro desistente 
porque de memórias se teve em filiação 
.olho o lugar onde há pouco invoquei a serpente 
.não sei de rastos 
.sei de factos que me fascinam 
.assim convoco os vermes 
.o melro 
.o muro 
.os bastardos 
.os bárbaros 
.os náufragos e os errantes passageiros 
desta viagem cartografada ao milímetro 
.sabe-me a diferente o rastilho que a imuniza  
.sento-me ao lado da serpente a respirar desejos

e deixo-me apoucar na pausa 
.grácil e soberana






anny maddock





sabe a rio o galopar das marés






.
.
.


é neste saber a rio que galopo as marés 

que visto de algas os dedos 
.que dispo de búzios as mãos 
.que encosto ao ouvido o som do navegante 
.que me visto de neblina e me distancio 
em navios de prosa 
.que solto os ventos num adivinhar absoluto 
.que oblitero os mistérios engendrados 
ao longo da viagem 
.sou margem 
.e na dúvida 
um deserto de depurações marítimas 
.refúgio de um oceano em permanente ebulição 
.marmoto 
.um choque em cadeia onde as vagas se enrolam 
.carpideira de ondas declino o medo e 
regateio ao pôr-de-sol o testemunho 
de um tresloucado legado 
.que dizer dos peixes? 
que vozes lanço ao abismo? 
risos que se anunciam uma e outra vez 
.e assim neste saber a nada
faço do rio o meu acostar
.do mar um navio ao largo






anny maddock





acendo o futuro em verborreias místicas






.
.
.

um golpear de asas

.o dosear agreste de um sol sustido pela brisa 

quando a canícula deixa na pele gretada 
um cheiro ácido e 
o chilrido do melro traz-nos à memória 
gândaros vendavais 
.assombro de uma pincelada junto ao muro 
da velha mansão onde se acendem as noites 
para os dias recolherem o canto mouro 
das gentes serranas 
.são quadros 
.resguardos 
.anseios de uma menina-mulher abrigados 
em aveludadas recordações 
.nesse rumorejar aquoso de merendar o hoje 
deixo cravado no mármore um resto de grafittis
a fim de acender o futuro com novas acendalhas 
.de glosa em glosa declino as penitências 
semeadas no horto onde os moldes se rasgam e 
os mistérios perduram 
.de olvido em olvido perfumo-me na razão 
de ser
.e findo o logro dos abrigos garatujo o silêncio






anny maddock





em queda livre






.
.
.


eis-me pronta ao abocanhar das feras 

.ao festim dos bárbaros 
.à desistência 
.espero-me no papel dos cínicos 
.a omissão será o meu meio de transporte 
.sei-me no limite e insisto 
já que o desafiar o medo é o meu ponto de fusão 
.o encontro entre o desperdício e a teimosia 
próprios de um cansaço de meses 
.de anos 
.telegrafo frases parágrafos e linhas 
num agravar o tempo 
que deixo como um testamento des.alinhado 
.recolho os alinhavos presos às algibeiras 
de um casaco usado em demasia 
.desenho-me entre consoantes 
cada vez mais insanas 
num labirinto acostado de repetições 
.apresso-me na asperidade 
.na exigência de outros desafios  
.não ouso ignorar a fronteira 
.como sequência do equável

os eufemismos esperam-me 

do outro lado do portão 
.saio pela porta da frente

.às vogais talvez lúcidas 

deixo aberta a das traseiras






anny maddock