o poeta-pintor de corpos





george christakis




*
sente-lhe a boca
o oscilar do ventre
o arquejar do desejo
estendido no caminho do seu corpo

*
[ faz-se poeta//pintor de corpos
preso a uma corrente de 
corpos
ideias
sangue
cidades
noites ]
*
regressa ao quadro nominal

*
as mulheres não param de morrer dentro de si
as mulheres não param de viver em si

*
o barco do desejo levanta a âncora

*
ele é uma marca
havida
entre mãos
à espera de acordar
no corpo da mulher

*
onde pintará o poema



sei de-amar e rio ( resposta com a ironia que basta )





gabriel stanciu




*
sei de a-mar na vazante
e rio-me expectante na foz-do-quanto



imortal.idade





csaba markus




*
deixa-se embalar
no requebro das flores que a praia rejeita
em des.amor

*
*
*
como a loucura projectada
à imortal.idade



restos do paraíso armadilhado





cecil beaton




*
quero-me
( bolseira do excluso )
quando um pássaro poisado sobre os teus
ombros re.levar as subtilezas de uma carícia
res.guardada no relevo do teu sexo//fonte e tu
peregrino de outros mares
ousares o
embargo do meu corpo//foice .então
coifados pelo sangue das árvores seremos os
prescritos do Éden


quais apátridas



inscrição divina





andrius kovelinas




*
não acordes nem adormeças -
 meu amor
- o silêncio envolve a nostalgia dos segredos e
o sentido de nós inscreve-se no ventre túmido
dos deuses



voo raso ao encontro da “luz”





christian martin weiss




*
sentada sob a portada
penteio a última réstia de sol e
persigo o redopiar da pétala ao
encontro do chão
*
tento perdurá-la na tela ou
sustê-la na paleta que
pouso sobre a bancada

*
danço ao ritmo da
música que toca só para mim

*
abro as asas a Ícaro

*
sorvo a última labareda e
conduzo-me ao encontro dos deuses
para num murmúrio dúctil
assumir a malícia

dos Amantes

*
a tela

consente o luto de Dédalo 



criei em mim a miséria do verbo





vito campanella




*
gostaria de escrever um poema perfeito
muito perfeito

*
sento-me na primeira sílaba
e converso baixo com
a palavra que
teimosa
mente
se alapa à folha branca

*
deixo-a suspensa neste jogo que me apraz
.aguardo

um
dois
três minutos
*
qualquer sortilégio que apague a
vontade que se atém à razão

*
sei-me aquém-ou-além do fogo
mas não sei o que me reserva a vigília
quando o sono me
oferece de bandeja o poema 

despido de folhos e rendas
*
ninguém
me indica a passagem a fim de
chegar à fonte
ao poço
à árvore
ao pássaro
a um a-mar
prontos ao desmame

*
responso do belo ou sede dos deuses? 


estendo a face .recolho o beijo





xavier jamonet




*
trago
encostados ao meu bordão
a vergonha do verbo
a solidão do vagamundo
a miséria do sem abrigo e
a fome do meu irmão de sangue

*
torpe na in.diferença
dos bem in.tencionados

*
apronto-me ao laço



nada se vende ao des.barato





yefim shevchenko




*
-há velas a mais no desencanto

*
no momento exacto em que a face dos mortais
oscila entre o cair e o rebolar escada abaixo
a rotina estende-se ao encontro dos
sextros

*
tudo se suspende
numa promiscuidade (con)sentida
por deus e o demónio que de mãos dadas
se estendem sobre o mundo dos
homens

*
uma suavíssima música de câmara
como premissa de canto
espalha-se à volta
*
-há gorjeios a mais na serventia
*
e se me quedo entregue ao lastro do
arco-íris é porque o domínio das cores prevalece
sobre a vontade de motejar

*
ao desbarato se aliena o logro alheio



na dormência do Outono





christian schloe




oculto a náusea em velhos livros de
exigências nos quais deixo im.pressões digitais



regresso ao húmus





alexandra bochkareva




*
um denodo .um desvario de sol
proseia a sombra

no desvirtuar das marés

*
sobre o rochedo
cruzam-se memórias e oceanos

vagos



in.diferente ao vazar do nome





angelos razis




*
in.decoroso ofício de martelar o devaneio
anátema vigilante de um reponso
escuso


.sombras?

vestígios onde a tissura
se impõe à revelia do mestre
*
voláteis
túmulos no assomar da vazante



cantigas mansas ao vento





cecil beaton




*
descrente num sufoco sobre um
tempo árido urge implementar
um outro modo de estar aqui

ou ali
onde a temperatura oscila e
o aquecimento global concede
o prelúcido


um pouco de eufemismo
solicita-se para que a ordem se
estabeleça e o acordo entre as raças
seja o ponto de fusão


das horas que se têm frias .um gosto
ácido a im.prudência .o conflito ou a
forma de engordar o ignóbil

*
suprime-se a matiz do verbo .o agora
e o amanhã



se a perfídia me in.comoda





albert desmanges




*
não me tenho aquém
num solilóquio tenso
velejo ao largo sob
um adorno breve



Portugal menino





christian schloe




*
restos tácitos de um a dorme'Ser marujo
velejam sobre a quadratura e o mutismo

podres


derrame de alquimia num sobressalto
aquoso


velas ao mar
lutos em terra


um adeus menino sobre a fronte

resquício ácido dum mourejar ao
largo
*
Tágides ao leme na braga da idade



correm-me textos-rubros pelas veias





barbara bezina




*
correm-me textos-rubros
no recobro silente
das veias e

o quartejar das horas 

resiste
ao ondular da pele



é preciso re.pegar o verso





arno rafael minkkinen




*
não me adoço virgem em ânfora
madura .poço roborado que

a bilha decanta
jogo ardiloso onde a palavra se esgrime
e o verbo se esgota 

no momento urgente um ás que
se joga

um torpe ondular onde o canto se
espanta

sereias a mais no velame torcido e
o barco quebrado no a.deus ao cais

*
um sopro de vento em derrame de ave



perdulário jogo de morte





michael bilotta




*
o dízimo o poço a bilha que se
quebra a sede que não se esgota

febril

frente ao rio e ao mosto cansam-se
as palavras presas à cintura

- solto a água
que o vinho tarda
máscula de morte ou reflexo

turvo
de um sub.mundo erigido como lei

-sorvo o desgaste
o segredo urge e a sede corre

*
sublima-se o prémio em casta mudez



quando as palavras se pegam pelos cornos





andré kertesz




*
ordeiro e submisso o rebanho regressa
ao redil .ordem a travo

no compromisso formal

.nada de subversões ou golpes de casta
que a fortuna corta-se ao fim do mês

os blasfemos subvertem a ordem e

a des.ordem atém-se ao toque
que se inscreve no gene

*
os esbirros 
(famélicos e cansados )
pelo engano dos asnos
aparelham os engodos cifrados



persiste uma asa fora do tempo





agnieszka motyka




*
um momento em que a dor agasta
um cheiro a morte 

uma semente crua regressada à terra
fora de tempo

um corpo moço .coração despido de batimento
.suspenso .errático cosido às urdiduras
da carne .os ossos sobejam a lonjura

dos legentes
*
adúlteros



arvoro a bandeira do desejo fácil





mihai criste




*
o verbo falo .a garganta fresca por onde
o leite desliza .corre  a paixão pelas
mãos e os braços .detém-se no pulso

ressurgem os trilhos outrora vagos

o declive da lua onde o sono se liquefaz
em cratera aberta 

relevos assentes no encontro com o sémen
que deixam escorrer por espaços amplos

as mãos envolvem um corpo
ávido .atávico o desejo cruzado em transe
.a carne virgem

*
a boca exangue .a vulva frágil



a vertiginosa dança dos átomos





karina marandijian




*
a dança reserva a voragem da lua e
tu – andrajo de peregrino - vestes os preâmbulos
a fim de purificar os

átomos invisíveis que à tona de água
balançam .Dionysios bebe .Phebo adormece
.Orpheu
verte na lira um véu de assombro e

os halos des.juízam-se pelos caminhos

*
a terra
acolhe no seu ventre a semente alçada em
vinho fermentado e

os corpos fragmentados em respiração ofegante

des.laçam-se projectados sobre as pedras



a contra-ordenação dos afectos





susan derges




*
uma página em branco

despojo de guerreiro largado
sobre a bancada .um sopro pedante

inspira .respira sob
os arquejos de um deus suado
.na epiderme quando a derme o

transpira

deixa um rasgo .não-breve

*
a mácula em cópula assumida na
vocalização dos afectos

havidos em contra-ordenação



o lugar do morto





oscar chichoni




*
porta aberta
ao espanto grado de não estar ali

.um acordar já tarde .cobiçados os
sonos nas gargalhadas banidas

.regurgitam desertos famintos os dedos
e as mãos que se estendem
retornam es.moucadas

*
do lado de fora a noite é o manto
a cadência o uso o negrume e o

trilho desmente o rasgar dos címbalos



des.minto a ironia des.construindo-a





monika serkowska




*
variações ao tom .ao ritmo ao acaso
ao transitório que percorre a tardança

ilusão aparente de sermos corpos
in.igualáveis na variável tempo

Ser o não-Ser

arrastando o esqueleto em
dúbias voragens em passos e cinzas

a euforia tangente

*
fermento .semente
.ferida aberta onde o mosto coalha



quando a tarde me arrefece o juízo





mihai christe




*
canto
num salto morno
no frio agreste que toma o mando

canto
a sevícia ou a sextilha
em restos percalços ou sobressaltos

canto
um estar a sós no meio de muitos
um gosto acre .um delírio célere
um aparvalhar de nós num restar

in.diferente

*
canto
ao não gostar quando o gostar ofende
resíduos de gente .viuvez a muitos .vozes
a mais num lugar gentio .cantos vadios

esgares somente



na dormência do Verão





christin atria




regorjeio entre a modorra e o sigilo ondulando
a voz nos estilhaços das marés



em tempo de pausa





michael bilotta




*
inusitada
mente
insisto na necessidade de dizer
não não e não

*
o sim enlouquece



na poalha do tempo vadio





andré kertesz




*
na poalha do tempo o silêncio amora
.a poeira levanta-se .a ansiedade incita

a escrita acontece

no momento seguinte prendem-se os galhos
no declive das fontes  .no desafio dos cantos 

cansam-se os motes .na construção do ponto
a criação desmente o cravo e a pauta

a música acontece

impõem-se as Musas

calam-se os deuses vazios de sentido
num recurso mal.dito .o verso inscreve-se

*
o poema acontece  


vadiagem de sentidos





mihai christe




*
bastardia de sentimentos no sussurro
do vento .cúmplices os augúrios
vergam

as noites em fúlgidos olvidos

o estertor selvagem sagra a
fúria dos castos .dos deuses cruzam-se  

salmos que na gleba recolhem
memórias
*
golpejos de anjos

na vadiagem dos gentios morrentes



no estertor do vento norte





agnieszka motyka




*
um prazo escasso .baço .esquisso de
segredo escorchado em verso livre

.sopro de poema ou atentado ao
escárnio que escorre pelas arcadas do templo

.ressoam ecos .oficinas de copistas
enquadradas em iluminuras quinhentistas
rasgos alquímicos onde o conhecimento
demora

no coruchéu do estro

*
soltam-se os véus .des.montam-se as tendas
.mal.dizem-se os poetas no riso nocturno



escrever é a forma mais nobre de transgredir





anne bachelier




*
escusa a força da palavra .a lucidez
da escrita .a verbalização da frase .o ser questão

de fora

se o dentro exige a ascese
.a palavra explode convulsa no nexo
sofrido que o estro exige

o parágrafo assaca e a verborreia transgride
a noção de lapso .vacatura de assentos

*
.egoísmos em acomodação ou o narcisismo
iniciado .a alquimia do verbo

licenciado



tudo se escreve com fumo





josé rodrigues





*
enquanto água
insinuo
*

o fogo



sobre a geografia do silêncio





josé rodrigues





 *
que dizer de um tempo que já não é tempo 

de longevos dignitários?
*
das facas que se aceram em ideários
lançados ao esquecimento?
 *
e que silêncio é este em que se algema a verdade
cortês presa de desordem?

*
e nós?
será que nos
bastamos em nuvens inaugurais
porque Juno se desmedra em apressados cenários?



é assim que me sou distância





josé rodrigues





*
canto os signos numa vertigem esquiva
*
num tanto faz

códice revestido de mofo
*
o fantasma vagueia no desalinho da ópera
em loquaz abandono

e as máscaras

exigem como padrão o roer as unhas

*
acusado o salmo



des.gostando o não ser já





josé rodrigues





*
um frio mais acima

no ouvir o tempo

*

um arrastar de gente

no limite

*

o futuro que não chega

ao presente
*

o poder em navalhada

de não ser

hoje

agora

*

a mudança