o mi [ ni ] stério da minha educação






-alexandra mazzanti




*
reservo por esta noite a carne de um poema
onde as palavras se
tornam o elemento fundamental
ao fio de prumo
*
alguém tem o dever de negociar
o direito à imortal.idade
*
durmo debruçada sobre mim e
espalho sobre a carne
a respiração do deus que
não aceita as minhas propostas
*
acendo-lhe algumas razões
.responde-me o silêncio

in.flexível
*
ergo trincheiras de poemas
porque sei que nenhum poeta se deita
em terra calcinada
*
.talho a minha nudez no delírio divino e

declaro luto nacional às borboletas





bocas abertas ao grito







-daria endressen




*
senhores de um
estar órfãos somos Seres
em in.delével conflito
paridos para sermos iguais ao dia e
à noite

*
compulsivos predadores

*

bocas abertas ao grito



in.transitivo





-natalie picoulet




*
um vazio oblíquo
estende-se rumo ao in.finito e
nada resiste à cor
inserida numa linguagem primária

*
Mähler rasga a 3ª sinfonia

*
sob um sol escaldante
a imagem de um mancebo
em fato de marujo
inicia a dança do fauno
in.transitivo

em trânsito



inverno leituras e poesia * ou a metáfora do ser




reli há alguns dias um magnífico texto de Nuno Artur da Silva intitulado “Outono, Leitura, Poesia” que voluntaria mente acabou por dar origem a este meu texto 

sem plagiar o autor permitam-me porque mais oportuno à minha narrativa um outro título cúmplice do hoje e do amanhã: “inverno, leituras e poesia

o ano principia .Fevereiro é o segundo mês

para alguns é altura de esboçar novos contornos de deitar contas à vida de dizer – “ano novo vida nova
todavia mau grado as boas intenções os dias começam a repisar-se nos roteiros iguais das cidades ao repetirmos diaria mente os mesmos gestos
prometemos então a nós mesmos novas leituras e novas “escritas” e as palavras e os livros voltam a habitar-nos
ocupam-nos novos personagens os seus enredos as suas imagens .enchemo-nos no espírito dos livros

a ficção repete-se e com ela os incidentes os lugares as estações o acaso do primeiro ou último encontro o simulacro de cada um de nós .é a rotina .o cansaço no desinteresse dos mesmos gestos .há que reinventar as palavras e escrever um outro ( ou porque não? ) o mesmo texto ?estamos sitiados devassados naufragados na voragem dos simulacros .criamos ilhas de vontades .estabelecemos ligações unidades de sentidos narrativas existenciais e procuramos elaborar a arte de não representar .antes uma forma criativa de viver .um estilo .uma nova escrita .uma outra ficção

então o autor põe-se a escrever .escreve mas a partir de um determinado momento e por razões alheias à sua vontade interroga-se e sem causa aparente escreve e o outro que não é parte integrante do texto nasce e começa a surgir primeiro de uma forma difusa depois em crescendo por fim em grande plano com um olhar velado ou mesmo cego como se olhasse para onde não pode olhar .não pode? e não pode porquê?

porque há quem como eu se demore em bibliotecas públicas pessoais privadas arquivos livrarias

o documento e o livro são a nossa profissão .fazem-nos simultanea mente autores de… .leitores de…

estou atenta mas gosto sobremaneira do desinteressado abandono de uma obra esquecida em qualquer prateleira .fazem de mim ( aliás é esse o seu objectivo ) um leitor//autor um aventureiro errante que procura em cada obra ou estante uma nova aventura sem saber se a encontrará ou sequer se a terá encontrado se acaso a encontrar

mas o autor//leitor escreve? e se escreve escreve de onde? quando? como? para quem?

é por falta de respostas que gosto de imaginar comunidades unidas na narrativa implícita de um livro .este permite-me ficcionar sociedades ideais redes de cumplicidades encontros paixões nostalgias movendo corpos e vontades .sem restringimentos culpas ou oportunismos .que enfado este o dos ismos

da leitura cúmplice como aliás de qualquer cumplicidade cada um ganha o seu estatuto de “intelectual” porque é capaz de escolher naquilo que há para ler o que vale a pena ser lido o que vale a pena ser retido porque ler coloca-nos sempre no futuro e assim cresce a inteligência de cada um na inteligência de todos colocando-se o leitor como um elemento de um corpo que aumenta os sentidos e o sentido disponível para uma inteligência comum apesar de sempre privada

e deste modo singular o “estar com” e o “estar em“ passam a ser uma respiração de sinais no “coração” do caos .uma travessia do real uma passagem ao imaginário .ser é integrar o enigma da linguagem .ler o da comunicação .razão porque um dia afirmei que escrever mais não é do que uma forma imperfeita de ser talvez mesmo o seu excesso

entre o ser o escrever e o ler há um equilíbrio radical

há que torná-lo real invernal mente na Poesia



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*"Outono ,Leitura ,Poesia",de Nuno Artur da Silva




revisitando a distância





-amy huddleston




*
não devo abrir a página dos nomes
como não devo acordar a palavra
encostada à distância

- desmonto e não me apresso -

*
tangem as harpas



na confusão das fontes






-daria endressen.



*
laço des.faço e traço o fio com que Penélope
na confusão pusilâme do Ser se apraz
em a.braço para na clássica quietude da
tarde quedar-se atenta à vigilância dos que
ainda hão-de chegar

*
um rodopio doce é o elo entre
o agora e o porvir entre mim e a evidência do
ante-Ser que se esfuma no mistério da criação

*
tudo o que faço des.faço ou traço é apenas o
alimento exaurido pelo sangue novo
que quando lúcida deixo escorrer entre a
a noite e os versos golpeados pela tesoura
aberta na Ausência

*
sorvo o silêncio e tenho sede


entre o vício da escrita e da leitura





-laurie kaplovitz.




*
sinuosos os dedos regressam à dança
copular e voltam a deslizar sobre a robustez
dos Eus cujas frases orgásticas se precipitam como

reflexos viciados de um perdulário leitor