triplo bluff




para certos intelectuais de direita ,a minha escrita é uma porcaria surrealista e eu sou um "animal" racional de mau feitio e muitíssimo mal educado - não respondo a provocações .não discuto

para alguns intelectuais de centro-esquerda a minha escrita é criativa mas não percebem porque fujo aos padrões da NORMA .sorriem de um modo displicente .admiram-me e são obrigados a tolerar-me

para os intelectuais de esquerda ( primus inter pares ) a minha escrita é forte amadurecida e já merecia um destaque maior .esses conhecem-me e sabem que sou autêntica .mas porque já não discuto mesmo quando me tentam dizem que perdi qualidades .e eu? não sei quem sou quando no caminho diário para casa me misturo no cimento da multidão gritante indiferente aos juízos de valor .acresço-me aos fins de tarde e prendo-me às imagens que qual filme decorrem na minha mente .ouso questionar o uso abusivo e verifico o ridículo de quem utiliza quem

desfaço em mim o equívoco e prendo-me ao significante .às palavras que têm uma vivência muito própria .são aqueles minúsculos pontos de interferência que me comandam .desde sempre .fazem-no de um modo inconsciente .quando pretendo conduzi-las ou apontá-las em outra direcção elas brincam comigo e juntam-se a seu belo prazer .conduzem-me .sigo-as no turbilhão ora ordenado ora desordenado das ideias que me afluem em catadupa .não ouso interferir com os textos porque se o fizesse perderia a minha liberdade criativa e passaria a ser presa fácil dos meus impulsos .não pretendo que as minhas pulsões interiores sejam os almirantes das minhas naus .gosto de navegar à bolina .ao sabor da corrente sem piloto e não tenho problema algum em fazê-lo só ou acompanhada

não .não estou a ser 100% sincera .prefiro entre o navegar só ou acompanhada fazê-lo acompanhada .há momentos porém em que o silêncio quando rodeada de muita gente me atrai sobremaneira .não consigo entender os atropelos por excitação de encontros ou por feitio e  por tal afasto-me por muito que isto possa incomodar terceiros .que querem? o meu fascínio pelo genuíno passou a ser muito mais forte .não pretendo acrescentar nada à verdade dos outros mas também não pretendo que interfiram na minha .se alguém ousa empurrar-me como uma mancha indecente em direcção contrária - o que é difícil - sou capaz de magoar mesmo com intenção .assumo mas uso a desculpa táctil no momento seguinte .paro .penso fundo e ofereço os meus lugares de paz qual flor invisível aos amigos

sou humana .regresso às ruas para voltar a sentar-me no beiral das palavras .estas nunca me magoaram ao longo da minha vida .aproveito o momento de pausa para cogitar em surdina e reparo com um misto de tristeza que os menos tolerantes ou não informados remetem sempre para outrem a causa da sua dor .passam a ser os seus pontos de unidade .interferem connosco e ao fazê-lo fazem-no de um modo fácil e egoísta no limite primário dos seus SUPEREGOs
há muito que não pensava assim
faço-o agora liberta de qualquer mágoa e nesta conversa sana comigo mesma .pouco me importa saber se existo nas palavras .pouco me importa saber se sou .pouco me importa saber o SABER

( triplo bluff )

deixem-me pensar que estou feliz apesar de presa a uma endémica incerteza
prefiro-a .como prefiro ser comandada pelos meus textos surrealistas pretéritos imperfeitos mais do que perfeitos presentes condicionais e futuros .até mesmo incompreendidos .rasurados .a facilidade sempre me molestou .atedia-me
desço as ruas que vou tecendo ao longo das páginas .nada me dizem as imagens encomendadas .sou uma profissional do jogo .jogo o ás de espadas e sou forçada a substituir os trunfos por outros mais autênticos no meu crescimento precoce .ah! já sei que não acreditam ( pouco importa .não sei se sou uma simples criação de mim .não sei )
prefiro-me no silêncio.