no silêncio das horas






lucio ranucci






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era doce a voz que recolhia o sabor
do parto .era acre o canto que o revestia
.e esta proximidade de sangue obrigava-a
ao recolhimento .não à prece .coabitava
amiúde com os epitáfios que a tinham por
companheira .mais além .sôfrego o silêncio
das horas criava raízes nas palavras e
estas cativas dos seus lugares de memória
revigoravam-na entre o nascer do fogo
e a ruína do tempo .havia palavras que
lhe ficavam suspensas na cabeça e
com as quais tecia rendas de agasalho
enquanto a música de ficar se enlaçava
ao sussurro de partir numa ânsia tão
forte quanto o estrépito do trovão que
ao longe
lhe desenhava heranças de bem querer .da
terra recolhia a semente do inventar

.e assim entre a voz que é lhe embalo e a
escrita que lhe é tormenta deixa-se preguiçar
ao sabor das coisas simples